Vamos falar um pouco da história da Evergrande, para que você entenda como tudo se desenhou, até chegarmos a esse ponto sem volta.
A Evergrande é um grupo comercial criado em 1996 e anteriormente se chamava grupo Hendga. A empresa cresceu de forma vertiginosa no ano de 2009 quando aconteceu o seu IPO na bolsa de Honk Kong, o que tornou o seu CEO um dos 10 homens mais ricos de toda a China.
Em 2008 a China adotou uma politica muito parecida com a petista criando o projeto da minha casa minha vida. Essa política de habitação da China tentou incentivar as pessoas a saírem das zonas rurais onde existe grande parte da pobreza chinesa (ou do oeste chinês) criando cidades artificiais e ao redor de grandes centros para desafogar a população, facilitando o fluxo naquelas regiões. Então para atrair a população, o governo criou shoppings centers, praças, lojas e até grandes universidades “totalmente gratuitas”, como forma de incentivo para fazer com que as pessoas fossem morar nesses locais.
Em tese, esse plano centralizador parecia ter tudo para dar certo. A população ganharia moradias, acesso à universidades e poderiam viver em uma cidade nova e planejada, tudo o que um petista sonha. No entanto, como sempre falo, a ação humana é imprevisível e suas consequências incalculáveis. Tendo como resultado dessa ação, a China acabou produzindo uma bolha imobiliária sem precedentes. Com cerca de 50 milhões de imóveis desocupados, o que representa mais de 20{6f48c0d7d5f1babd031e994b4ce143dfcbd9a3bc2a21b0a64df4e7af5a5150a1} das habitações urbanas do país e o risco de um colapso no setor assusta governos e investidores.
Só para a gente ter noção do quanto esse boom imobiliário foi forte, de 2011 até 2021, ou seja, nos últimos 10 anos, a China produziu mais concreto do que foi produzido nos EUA durante o século XX.
A Evergrande surfou nesse boom imobiliário criando grandes projetos e fornecendo para o mercado imóveis de médio e alto padrão. Nesse período, muitas famílias aproveitaram para especular com o preço dos imóveis. Até que, no ano passado, o governo chinês resolveu fazer frente à especulação imobiliária. Para o governo, moradias não são para especular. Essa nova diretriz impactou diretamente as receitas da Evergrande que, até o presente momento, vinha pegando dinheiro no mercado e investindo em novos projetos.
Uma coisa que chama a atenção é como a Evergrande foi diversificando seus investimentos com o passar do tempo. Ela investiu não só em construção civil, mas também em um time de futebol – que foi rebaixado – e até em veículos elétricos.
Com toda essa diversificação e com a facilidade que ela teve de tomar empréstimos, a Evergrande chegou a se tornar o segundo maior grupo empresarial da China. Porém, tendo hoje em dia como contraponto, sendo a empresa que possui a maior dívida empresarial do mundo no valor de 300 bilhões de dólares.
Dívida essa que passou a existir desde a sua abertura na bolsa em 2009, sendo uma das empresas que receberam muitos investimentos externos devido a grande especulação que existia naquela área, e também pelo programa chinês referente a política de habitação. Com todo esse volume de capital a empresa teve facilidade de acessar créditos e usar o dinheiro de acionistas para traçar novos projetos. Porém, aí se inicia uma longa série de acontecimentos. A empresa começou a criar casas sem demanda real, baseados na ideia de gerar demanda – porém isso não deu certo e como consequência do fracasso nas vendas de conjuntos habitacionais, a empresa começou a acumular dívidas. Para pagar tudo isso, o dinheiro que seria destinado para novos empreendimentos foi gasto na rolagem das dívidas antigas.
Essa prática da Evergrande se repetiu durante anos, gerando um efeito bola de neve. Nada na economia acontece de uma hora para outra. O colapso de uma grande empresa é apenas o resultado de uma série de escolhas erradas que não foram corrigidas com o passar do tempo. Neste caso, é interessante ressaltar que a empresa já estava pegando dinheiro dos clientes finais para saldar dívidas com bancos.
Por exemplo, para financiar um imóvel lá na China, o comprador precisa dar uma entrada de, no mínimo, um terço do valor do imóvel. A Evergrande usava esse dinheiro para pagar parte das suas dívidas. Para termos uma noção de valor: Um apartamento simples em Pequim, com os padrões que a empresa vendia, chegavam a custar na média 1 milhão de dólares. Ou seja, você teria que pagar 333 mil dólares para eles iniciarem a construção – e todo esse dinheiro era usado instantaneamente para pagar as dívidas.
Em 2018 existiram boatos que a empresa havia enviado uma carta de pedido de resgate ao PCC, afirmando risco de calote e pedindo um resgate vindo do governo chinês. Essa noticia se espalhou e as ações caíram, logo eles surgiram dizendo que estava tudo bem com a empresa e negando todos os boatos.
Então você me pergunta: Se em 2018 ela estava ok, por que logo em 2021 ela explodiu? Muito simples: ela mentiu! Sua situação era muito complicada desde então, o que fez ela sucumbir foi a pandemia do Covid-19 (na verdade do Lockdown imposto pelos governos) entrando então em colapso, com todos em casa impedidos de trabalhar. O nível de investimentos diminuiu, fazendo com que a Evergrande não tivesse acesso aos pagamentos de ⅓ adiantados das contruções, para pagar suas contas. Sendo assim, o que já era inevitável apenas aconteceu mais cedo! O sistema de rolagem de dívidas da Evergrande colapsou. Não foi possível a Evergrande continuar dando resposta aos bancos e aos seus investidores.
Hoje em dia, segundo o Tradingview, a dívida total da empresa é mais de 20 vezes maior do que o seu valor de mercado que é de 300 bilhões de dólares, o que fez soar um alerta para os mercados em todo o mundo. Se a Evergrade quebrar, isso não será um problema apenas para os seus funcionários e acionistas, mas derrubará uma série de empresas do setor financeiro que têm investimentos na companhia. Bem como prejudicará uma série de clientes e fornecedores, gerando um efeito dominó que, com certeza chegará até nós.
Este é um evento que se assemelha muito com a crise do subprime que aconteceu em 2008 nos EUA. Na época, o presidente Lula chamou de “marolinha”, mas essa tal marolinha representou o fim de uma grande quantidade de empresas ao redor do mundo. Considerada por muitos economistas como a pior crise econômica desde a Grande Depressão (1929), a crise financeira de 2008 ocorreu devido a uma bolha imobiliária nos Estados Unidos, causada pelo aumento nos valores imobiliários, que não foi acompanhado por um aumento de renda da população. Em outras palavras, os bancos passaram a oferecer empréstimos a juros baixos para a população financiar a compra de imóveis – mesmo para pessoas que não conseguiam comprovar renda suficiente para quitá-los! Isso aumentou a procura por imóveis, e com isso os preços foram subindo, não pela valorização das áreas, mas apenas porque mais pessoas estavam procurando imóveis.
Porém no caso da Evergrande os papéis se invertem, sendo que a empresa chinesa construiu muitos imóveis – estimulada pela política chinesa – acreditando que existiriam milhares de compradores e que realmente toda aquela população que vivia no interior do país fosse buscar uma vida vista por muitos como “melhor”. Afinal qual brasileiro não sairia do interior, para morar em um centro completamente planejado, com “faculdade gratuita”, shoppings e tudo mais? Parece incrível, mas não era essa a vontade do povo chinês. Por não existirem clientes suficientes para fazer com que esse investimento tivesse retorno, criou-se todo o cenário que assistimos hoje nos veículos de comunicação.
A Evergrande é uma das empresas consideradas Too big to fail (grandes demais para quebrar), contando com mais de 125 mil funcionários diretos e por ser a empresa que detém 20{6f48c0d7d5f1babd031e994b4ce143dfcbd9a3bc2a21b0a64df4e7af5a5150a1} de todo o mercado imobiliário chinês, empregam milhões de outros trabalhadores de forma indiretas. Um exemplo de empresas desse tipo seria a Vale do Rio Doce, que com todo essa confusão e risco de quebra da gigante chinesa teve suas ações diluídas em 17{6f48c0d7d5f1babd031e994b4ce143dfcbd9a3bc2a21b0a64df4e7af5a5150a1} tendo em vista ser uma empresa que possui 60{6f48c0d7d5f1babd031e994b4ce143dfcbd9a3bc2a21b0a64df4e7af5a5150a1} da sua produção destinada ao mercado chinês.
O impacto foi tão grande que afetou até o mercado de cripto, não apenas devido a busca por liquidez em caso de crise global vinculada ao estouro da bolha imobiliária chinesa, que já é evidente existir, mas também devido a dólar Theter ter 60{6f48c0d7d5f1babd031e994b4ce143dfcbd9a3bc2a21b0a64df4e7af5a5150a1} do seu fundo baseado em contratos, sendo partes desses contrato localizados na bolsa de Hong Kong – justamente a mesma bolsa de valores onde se localiza os contratos de dívidas da Evergrande. Ou seja, a liquidez do mercado de criptomoedas é afetada tendo a destruição de parte do seu fundo devido ao calote da empresa chinesa. Enfim, deste modo é evidente que o fechamento da Evergrande significa a morte de inúmeras outras empresas no mundo, assim como aconteceu em 2008.
A China já disse que não irá resgatar a empresa, mas simplesmente é um blefe pífio. É óbvio que o partido comunista chinês não permitirá que uma empresa desse porte e com toda essa dívida vá à falência, levando com ela grande parte do mercado, não só chinês mas também global, gerando uma crise onde ela seria a grande culpada, estragando toda sua imagem externa e destruindo suas empresas. Portanto, a estratégia da china talvez siga uma linha intervencionista, porém não tão intensa como a americana, que mesmo após 13 anos da quebra do Lehman Brother ‘s não conseguiu se recuperar totalmente daquele embate. Talvez para não acabar como o FED americano, a ideia do PCC seja apenas de comprar o mínimo possível para que um pouco adiante, quando a queda vier, ela seja menos prejudicial.
Mais uma vez, é a mesma história se repetindo: Transferência de riqueza da população pobre para a população rica, pois os impostos dos contribuintes dos países estão sendo usados para salvar empresas irresponsáveis – que deveriam quebrar logo, mas estão inchando o bolso dos seus donos, enquanto a população carece do básico: Alimento, liberdade, trabalho. Clamam por menos impostos, pedindo por autonomia do seu próprio destino, sem ter que pagar no final pelos erros dos governos e seus amigos. Tudo isso é culpa de mais um plano centralizador de poder e um grupo de pessoas que acham que sabem o que é melhor para a vida dos outros.